RUA DO POÇO DOS NEGROS
Rua da antiga freguesia de Santa Catarina, freguesia da Misericórdia, Lisboa, Portugal.
Um topónimo com duas explicações.
«A Rua do Poço dos Negros interliga a Calçada do Combro com o bairro da Madragoa. As explicações históricas sobre o topónimo foram investigadas, principalmente, por Isabel Castro Henriques, especialista em História da África, e pelo olisipógrafo José Sarmento de Matos, que chegaram a duas divergentes conclusões. De um lado, o nome é justificado pela ordem dada por D. Manuel I, em 1515, de escavar um poço onde colocar os corpos dos escravizados falecidos, recém-chegados a Portugal, visando travar a prática de os atirarem pelas encostas de Santa Catarina e evitar, desta forma, miasmas e pestilências. Do outro lado, o topónimo é explicado pela presença de um poço de água pertencente aos Beneditinos, chamados ‘padres Negros’ por causa do traje, ao qual o povo de Lisboa tinha livre acesso. Nas interpretações dos dois autores emerge a evidência do tema sensível, que toca cordas ligadas à maneira de reconhecer e elaborar o passado colonial português, em particular, no que diz respeito ao tráfego negreiro atlântico.
Na última década, a toponímia das cidades europeias tem vindo a ser questionada.(...)»
(https://echoes.ces.uc.pt/expo-lisboa/rua-do-poco-dos-negros/)
«A Rua do Poço dos Negros tem origem do seu topónimo possivelmente ligado à existência de uma carta régia de D. Manuel I, datada de 13 de Novembro de 1515, escrita em Almeirim e dirigida à cidade de Lisboa, sobre a necessidade de se construir um poço para depositar os corpos dos escravos mortos, sobretudo aquando de surtos epidémicos.
Diz a carta que os escravos eram mal sepultados e muitos seriam mesmo lançados "na lixeira que está junto da Cruz da Pedra a Santa Catarina (actual Rua Marechal Saldanha) que está no caminho que vai da porta de Santa Catarina para Santos", ou para a praia onde ficavam à mercê da voracidade dos cães.
Para evitar as deletérias consequências de tantos cadáveres não sepultados, achava o Rei "que o melhor remédio será fazer-se um poço, o mais fundo que pudesse ser, no lugar que fosse mais conveniente, no qual se lançassem os ditos escravos" e para ajudar a decomposição dos corpos dizia ainda que se deitasse "alguma quantidade de cal virgem" de quando em quando.
Tal medida seria cumprida pela Câmara, que o teria mandado fazer no referido caminho para Santos (descendo a actual Calçada do Combro, conhecido por Horta Navia - nome de uma divindade indígena após a ocupação Romana).
A actual localização perdeu-se, mas a aproximação geográfica do antigo Largo do Poço Novo (actual Largo Dr. António de Sousa de Macedo) ao fundo da Calçada do Combro, nome que já nos aparece na segunda metade de Quinhentos em substituição da designação primeva, comodamente parece ajudar na sua localização.»
(https://aps-ruasdelisboacomhistria.blogspot.com/2010/06/rua-do-poco-dos-negros-i.html)
«Antes de se esmiuçar a origem do topónimo, convirá lembrar que a primeira preocupação com os escravos era baptizá-los, percebessem ou não o significado, e só depois eram trazidos para servir em Lisboa. Portanto, os escravos eram membros da comunidade cristã. Ora, como é sabido, todo o cristão tinha de ser sepultado em terreno sagrado, ou seja, então dentro das igrejas, quando havia posses para tal, ou nos adros respectivos, para os mais carenciados. Logo atirar corpos de cristãos para poços não era prática legitimada, pelo que tal ideia não tem qualquer fundamento.
No entanto, no século XVI, por exemplo, quando Lisboa era assolada por epidemias de peste, sabe-se que o rei D. Manuel mandou abrir valas comuns para recolher cadáveres pestíferos, quer por as igrejas estarem sobrelotadas, quer para evitar contágios. Sabe-se mesmo que uma dessas valas foi aberta não longe desta zona do actual Poço dos Negros, então área erma na periferia da cidade.
Após o concílio de Trento, os dois ramos dos beneditinos, ordens até então cingidas ao mundo rural, instalaram conventos dentro das cidades. Os cistercienses, ditos os Brancos dada a cor da capa, abrem no convento do Desterro uma "sucursal" da casa-mãe de Alcobaça. Quanto aos cluniacenses, chamados os Negros, por ser dessa cor a sua larga capa, vieram de Tibães e Santo Tirso para a capital. Adquiriram uma enorme propriedade na encosta que hoje chamamos a Estrela, limitada em baixo pelo vale que rapidamente se chamou de São Bento. (...)
Acontece que os padres Negros, como todos lhes chamavam, dispunham, no limite sul da propriedade, de um poço farto que rapidamente - talvez até para ganhar simpatias - puseram à disposição da vizinhança. Daí, agradecidos, os beneficiários usufruíam a água preciosa que os padres lhes ofereciam, chamando-lhe por isso o Poço dos Padres Negros, ou, para encurtar, o Poço dos Negros.
É esta, simplesmente, a origem do topónimo que tanta indignação tem gerado em espíritos por certo pesarosos pelas práticas menos humanas dos seus antepassados. Só que neste caso não há razão para tal, pois os Negros são meros padres disponíveis a ajudar o próximo.»
(https://www.publico.pt/2012/09/16/jornal/o-poco-dos-negros-25249089)
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